Em 1760, a Lei da Conservação das Massas foi publicada por Lavoisier. Esta lei diz que tudo que existe provém de matéria preexistente. A partir dela surge a afirmação bastante conhecida e testada não só nos laboratórios de ciência, mas também na gastronomia: na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma.
Toda receita surge da transformação de vários ingredientes em um prato único. Misturamos, picamos, batemos, aquecemos até obtermos a transformação desejada.
Às vezes precisamos de paciência, outras de técnicas especiais, e ainda algumas vezes, apenas de um pouquinho de curiosidade.
Curiosidade que surge de um simples comentário vindo sabe-se de onde e através de que voz, mas que ficou ecoando em minha cabeça como aquela música que só se conhece o refrão.
Curiosidade que surge de um simples comentário vindo sabe-se de onde e através de que voz, mas que ficou ecoando em minha cabeça como aquela música que só se conhece o refrão.
E como a música que só vai embora depois que a ouvimos inteira, idéias só vão embora depois de serem empiricamente colocadas à prova.
Este comentário sorrateiro me intrigou tanto, justamente por não ser uma dica de receita, algo a se fazer para obter um prato, mas sim algo a ser feito para construir um ingrediente.
Ingrediente este dos mais comuns e do qual, eu me arriscaria a dizer, a culinária francesa clássica é totalmente dependente: a manteiga.
Confesso minha ignorância por nunca ter me feito uma pergunta simples: o que é a manteiga?
Como se faz manteiga?
Você pode me dizer?
Então preste atenção!
Queria mesmo saber.
Que ela é um derivado do leite, eu estava cansada de saber, mas como fazer manteiga?
Claro que eu sabia que ela não nascia pronta e embalada nas geladeiras dos supermecados, mas seria possível produzí-la em casa? Sem nenhum equipamento especial? E o trabalho que dava?
Algum mistério deveria haver. Talvez por crer nesse mistério o comentário feito para se ter cuidado ao bater chantilly pois se passasse do ponto viraria manteiga, me deixou tão entusiasmada para esta empreitada.
Pois é, manteiga nada mais é do que creme de leite batido, assim como chantilly. Só precisa de um pouquinho mais de tempo.
Levanta a mão agora quem sabia disso.
Eu não fazia a mais remota idéia.
Peguei o creme de leite fresco, com 36% de gordura um pouquinho de sal e liguei a batedeira. Vi diante dos meus olhos aquele creme ganhar firmeza, ficar bem branquinho e aumentar de volume, sinais claros de que havia chegado ao primeiro estágio: chantilly.
Firme em meu propósito, e ainda um pouco incrédula, mantive o chantilly na batedeira por mais alguns minutos. Sempre em velocidade máxima.
Uns 10 minutos depois foi o momento em que um líquido começou a brotar do creme, separando-se da gordura que ficava levemente amarelada. Chegava então ao segundo estágio. De repente, não mais que de repente eis que muitos pedacinhos amarelos estavam espalhados e uma grande quantidade de uma água esbranquiçada dividia o espaço envolvendo-os.
Desliguei a batedeira com brilho nos olhos. Separei a água e coloquei toda a manteiga em um pote bem apertadinha.
A aparência me convenceu, mas faltava ainda o teste mais importante: o sabor.
Gente! Não é que era manteiga mesmo? Cremosa, salgadinha, gostosa e perfeita para se comer com pão.
A durabilidade é um pouco menor do que as que nascem no setor refrigerado dos mercados (cerca de uma semana) mas fica ótima, pode-se controlar a quantidade de sal e até inventar de saborizá-la.
Manteiga personalizada é outro nível.
Sei que achei fantástico desvendar este mistério e comprovar a transformação da matéria. Além de ser uma excelente forma de aproveitar o fundinho dos potes de creme de leite que sempre acabavam passando do prazo de validade. Olha a sustentabilidade aí.
E sabe aquela água que sobrou da manteiga? É o tal do buttermilk que aparece em algumas receitas, literalmente "leite de manteiga".
Ou seja, tudo se aproveita, pode guardar também e usar até a última gota.
Viu? Como se faz. Com creme de leite, a manteiga bem fresquinha.
Viu? Como se faz. Pra passar no pão uma manteiga cremosinha.
Minha professora de química ficaria orgulhosa de mim. Fiquei muito feliz com a descoberta, de verdade.
Para muita gente pode não ter sido nenhuma grande revelação, mas adorei conhecer um pouco mais de um ingrediente tão utilizado.
Mais do que isso, foi um grande incentivo a sempre questionar de onde vem cada ingrediente, como é feito, quais as transformações que sofre.
Ah! A gastronomia molecular que me aguarde.
HAHAHA!!! MUUUUITO DIVERTIDO ESTE POST. VC ESTÁ CADA VEZ MAIS INSPIRADA. CONSEGUI ATÉ OUVI A MUSIQUINHA, ERA DO RÁ TIM BUM? VIU, COMO SE FAZ...
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