quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Quem espera sempre alcança

Toda família tem histórias que se repetem sempre que surge um determinado assunto. Aqui em casa uma dessas histórias acontece sempre que falamos de culinária ibérica, ou sobre a bisa que eu nunca cheguei a conhecer.

É sempre igual, iniciar um desses assuntos e ouvir minha mãe contar com brilho no olhar sobre o aroma que preenchia todos os cômodos da casa cada vez que sua avó resolvia fazer migas. Começava com banha derretida, e terminava com uma tortinha de pão cheia de alho que dizia ela ser uma das receitas mais apreciadas em sua infância.

Trinta anos se passaram e eu continuava só a ouvir essa mesma história sem nunca ter provado tal sabor, e em minha boca muita água se formava só de ouvir o nome deste prato.

Pois é... minha mãe fez esta tortura familiar por muitos anos, acumulando vontades sem nunca saciá-las. Até que um belo dia... eu me cansei, a tranquei na cozinha e fiquei parada na porta vigiando com o chicote na mão. Ela só sairia dali após ter preparado a melhor migas de todos os tempos.

Tudo bem, não foi exatamente assim, mas fiz bastante pressão para convencê-la a arriscar-se a fazer a receita por ela tão idolatrada como um pequeno sabor de sua infância e uma deliciosa saudade de sua avó.

Migas é algo bastante simples e tradicional na culinária portuguesa. Como minha mãe descreveu é uma receita de pobre, feita com pão e muitos temperos, e claro, deliciosa e inesquecível.

Para começar, deve-se umedecer o pão. Escolhemos o pão francês mesmo, mas pode ser feito com broa, pão de forma ou qualquer outro pão que tiver à mão. Em uma travessa o pão deve ser grosseiramente picado e coberto de água. Depois de 2horas, o pão já terá absorvido a água e então começamos a temperar essa mistura com sal, azeite, pimenta do reino, salsa e cebolinha.


Em uma frigideira aqueça azeite e frite um pouco de bacon, quando já estiver bem torrado, acrescente 3 dentes de alho picados e deixe dourar. Acrescente então o pão e mexa bem até secar a água. Quando a água começar a secar, modele o pão de modo que pareça uma omelete e deixe fritar até que crie uma casca.

Vire para formar essa mesma casquinha do outro lado.

Básico, simples e como não podia ser diferente: um espetáculo.


Espetáculo este digno de ser assistido de camarote. E foi justamente isto que nosso prato principal do dia fez, assistiu a tudo de dentro de forno, confortavelmente sentado.

Para fazer o frango sentado a única coisa que é de fato fundamental é ter a forma própria para isto. Parece uma forma de pudim, mas com a parte central mais alta e as laterais bem baixinhas. Importante é sempre antes de preparar um frango, lavá-lo bem com bastante limão. Isso serve para tirar todo o cheiro de "granja" e qualquer eventual textura desagradável. Depois de lavar, vamos ao tempero.

Desta vez optamos por tempero pronto. Usamos sopa de cebola (daquelas de saquinho mesmo, mas própria para culinária), bastante azeite e o caldo de 2 laranjas.

O franguinho fica ali, fechado em uma travessa, todo besuntadinho até a hora de ser devidamente acomodado na forma, ter sua roupa muito bem ajustada (sim, estamos falando da pele presa na parte superior com o auxílio de palitos), com direito a luvas e sapatos (sim, cubra as pontas das asas e das coxas com alumínio).

Na parte inferior da forma acomode algumas batatas com um pouco de sal. A gordura e o tempero do frango irão escorrer para o fundo da forma, deixando as batatas saborizadas. De tempos em tempos, regue o frango, ou com o líquido que escorreu ou caso ache que não é suficiente, com um pouco de água fervente.

Demora cerca de 1hora e meia para que ele fique bem dourado.


O frango fica suculento, assado por igual, com pele crocante e com o mínimo necessário de gordura, sem falar das macias batatinhas que completam o cardápio.


Cardápio este aliás, que merece uma salva de palmas. Afinal para descobrir finalmente o sabor das migas até o frango já estava esperando sentado.

Um comentário:

  1. Hummm, sabor de infância: pipoquinha de canjica, pão do caipira, panqueca de chocolate da vó, cocada mole, maionese de frango no Natal, esfiha aberta da Paladar, esfiha fechada da mãe, bolo de côco embrulhadinho no alumínio, melequinha de leite Ninho...

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